quarta-feira, 22 de fevereiro de 2006


PRELÚDIO AO HOMEM DE PALHA
vai-te antes que deus erga os olhos invejosos
e alcance a ti e aos teus
sonhos de espantalho.

vai-te antes que os rios da floresta descubram
que é das tuas margens que brotam
as brincadeiras de roda e as palavras azuis.

[a celebração da poesia e o júbilo da loucura;
a fidelidade à terra e aos presságios da chuva]

vai-te em silêncio que é pra não despertar
a ira secreta dos anjos sem asas
essas cobaias que não puderam sorrir nem amar.

vai-te e não olha pra trás
porque nada há para ser visto
porque tudo vai ficar no seu devido lugar.

[tudo vai estar como sempre esteve;
tudo sobreviverá na mais perfeita apatia]

vai-te e leva contigo tuas estrelas
que com os vaga-lumes aprenderam a brilhar
e com os dentes-de-leão a se esconder da ventania.

vai-te e deixa comigo essa lua de isopor pendurada no céu
e um candeeiro cheio de querosene e de preces
pra quando a próxima noite despertar amortalhada

[na paródia das vidas vazias e arrastadas,
pouco importa aonde pretendemos chegar]

5 comentários:

Anônimo disse...

Douglas, lindo de tirar a respiração...
mas sim o homem de palha voará até universos de sonho onde não será possível a destruição chegar...
beijinho

Anônimo disse...

muito bonito, douglas..beijo

Cláudio B. Carlos disse...

Muito bom.

Bell... disse...

"vai-te e não olha pra trás
porque nada há para ser visto
porque tudo vai ficar no seu devido lugar."

ai que calma gostosa em te ler...


bjs*

m.t. disse...

Poeta, deus de papéis e palavras, de verdades e mentiras, de corações.

Deus, possuidor de tudo e sobretudo nada.
Deus, homem dono de céus e inferno, homem imortal ou mortal.
Independendo de seu coração, homem.
Espantalho, pobre boneco sofrido que espanta coisas tristes.
Espantalho, pobre boneco iludido que acredita espantar também sonhos.
Espantalho, que rege meus sonhos e alimenta minhas esperanças,
não me abandona nunca que essas tuas tardes de crepúsculo são eternas em minhas retinas, e o teu coração pulsa, vivo, perto do meu.